No primeiro texto (clique aqui se desejar ler), diferenciamos o amor apaixonado do amor companheiro.
Relembrando de uma maneira mais didática: o amor apaixonado está para o fósforo assim como o amor romântico está para o incenso.
O fósforo é pequeno e tem “pólvora” (clorato de potássio, na verdade) na ponta.
Quando há atrito da ponta com a parte áspera da caixinha, puff!
Acende-se uma chama legal, mas que apaga rapidinho.
Assim é o amor apaixonado: intenso, mas de curta duração.
O incenso, por outro lado, é mais comprido e tem brasa.
A brasa é suave e o incenso fica aceso durante muito mais tempo.
Assim é o amor romântico: pouco intenso, mas de maior duração.
Para mais comparações, continue a leitura!
Quando o mundo nos alegra, queremos repetir a dose.
A partir daí, cria-se uma relação de dependência entre você e essa parte do mundo que te alegrou.
Quando a causa dessa alegria é uma outra pessoa, por exemplo, ficamos à mercê.
É preciso contar com a boa vontade dessa pessoa de ficar perto de nós também.
Essa alegria, portanto, depende de algo que temos o menor controle: o outro.
Essa situação se assemelha a uma montanha russa, só que de emoções.
Picos de esperança e alegria; vales de medo e tristeza.
Muitos Filósofos não gostam desse tipo de brinquedo por não terem o controle do carrinho.
Os estoicos, por exemplo, preferem brincar no carrossel.
No carrossel, dá para ter bastante noção do quê e como as coisas vão acontecer.
Os cavalinhos dão voltas e voltas, tranquilamente, sem grandes oscilações.
Mas (e você há de concordar), às vezes, o carrossel pode ser muito chato e, por outro lado, a montanha russa, radical demais.
Uma boa pedida, dirá Clóvis de Barros Filhos, seria uma montanha russa moderada ou um carrossel mais agitadinho.
E aí, seu ingresso seria para qual brinquedo?
Independentemente da diversão, o parquinho sempre tem hora para fechar.
A pretensão de que os amores durem blasfema contra o mundo da vida, onde nada permanece.
Pretender um “para sempre” numa vida de trânsito é lutar contra a própria essência da nossa existência.
A dor é inerente à vida.
Sem dor, a vida também não existiria.
A dor está para a vida assim como a goiaba está para a goiabada.
Eis, então, que surge uma contradição no Amor.
Amar é assinar uma sentença que nos condenará a tristezas, cedo ou tarde.
A tristeza poderá vir no término de um namoro, na separação, no divórcio… e, na “melhor das hipóteses”, no luto de perder a pessoa amada.
Todas as relações (todas!), um dia, acabam.
A dor emocional da perda, inclusive, é processada quase que pelas mesmas circuitarias cerebrais que a dor física de quebrar uma perna, por exemplo.
Então vamos deixar de amar para evitar a dor da perda!
Então, lamento, essa também não é uma boa pedida.
Não amar significa viver menor.
O calor de outro ser humano é uma necessidade humana básica.
Relações sociais de qualidade são o fator mais importante para o bem-estar e felicidade dos seres humanos.
Precisamos amar para viver melhor.
Ao amar, confiamos que as alegrias serão grandes o suficiente para superar a eventual e provável tristeza da separação ou da perda.
Basicamente, temos duas opções nessa história: amar e perder ou perder por não amar. O que você escolheria?
Calma que tem mais um probleminha.
O ser amado vai embora um dia, eis o primeiro problema.
O segundo é que… (calma, se prepara).
Não conhecemos direito o ser amado! (pronto, falei).
Dizemos que amamos o fulano, mas… quem é fulano? O que fulano é?
Fulano é uma reunião de atributos complexos, às vezes contraditórios, díspares.
Uma pessoa é um catado de características.
Então o que, de fato, você ama nessa pessoa?
Muitas vezes, por conta de uma alegria sentida, nos apegamos e compramos um pacote grande, mas cheio de laranjas estranhas.
Você sabe, igual bandeja de morango: os de cima são lindos, grandes, atrativos, mas ao chegar na camada de baixo, lá estão os amassados, os feios, os podres…
É quase inevitável que uma pessoa seja capaz de alegrar e entristecer, quase ao mesmo tempo.
Para não te deixar ainda mais preocupado, caro leitor, agora vem a parte boa.
Dica de ouro do excelentíssimo Clóvis de Barros Filho (novamente ele porque sou fã):
“Quanto mais clara e firmemente os amantes se posicionarem, apresentando e agindo de acordo com seus valores e princípios, mais serão admirados e desejados. O valor amado dos amantes está nos valores que respeitam. Esse é o único objeto de amor que não esfarela pela vida”.
Vou simplificar a ideia: ame quem tenha valores dignos de serem valorizados.
Além da admiração, isso gera outro elemento importante nas relações: a confiança.
Confiança é uma certeza sem verificação, sem comprovação empírica.
Você tem certeza de que alguém agirá de um jeito ou de outro.
Para encerrar, trago o trecho de uma declaração amorosa filosoficamente verdadeira e verdadeiramente filosófica, contada pelo professor Pedro Calabrez:
“Eu estou sozinho. Ninguém pode viver por mim. Você está sozinho. Ninguém pode viver por você. O amor pode nos salvar disso. Dentro da minha solitude, a tua presença e a tua existência me tornam maior, mais leve, mais potente e mais feliz. Quando a solidão surge (porque ela é inevitável), a tua presença e a tua existência me protegem das angústias; me dão forças pra encarar as angústias da existência com mais alegria, menos tristeza, mais força, menos dor e mais coragem. Não porque nós somos metades, mas porque nós somos maiores juntos. Tua presença e a tua existência me tornam maior, me tornam melhor em mim mesmo”.
Grata pela leitura,
* Tati(ane) Fonseca é amiga da Filosofia, estudante de Mindfulness, Neurociência, Psicologia Positiva e praticante de Yoga
Referências Bibliográficas
BARROS FILHOS, Clóvis de; CALABREZ, Pedro. Em busca de nós mesmos. 1 ed. – São Paulo: Citadel Editora, 2017.
BARROS FILHOS, Clóvis de; KARNAL, Leandro. Felicidade ou morte. 1 ed. – São Paulo: Papirus 7 Mares, 2016.
Vídeos: https://www.youtube.com/watch?v=vbnkdTjFv_E e https://www.youtube.com/watch?v=b-twOMGmyRI
Imagem: Chanhee Lee. Disponível em: https://unsplash.com/photos/H-PdWvWiRWI
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